Vez ou outra alguns discursos se repetem. Repetem afirmações sem fundamentação, sem embasamento teórico, sem lógica e, principalmente, sem racionalidade. Um destes discursos questiona o direito das minorias de manifestar publicamente seu orgulho de ser o que são, reivindicando pra si o mesmo direito. Durante a realização da Parada do Orgulho Gay do ano passado, em São Paulo, um grupo de ignóbeis manifestantes apareceu na Avenida Paulista com faixas e cartazes dizendo ter ‘orgulho de ser hetero’.
A discussão é antiga. Nazistas e seus pares modernos, fascistas, xenófobos, racistas e outros agrupamentos de pessoas intolerantes clamam o direito de usar camisetas com as inscrições ‘100% Branco’ ou ‘Orgulho de ser branco’, em detrimento aos manifestos do movimento negro. Estes usam roupas e adereços que remetem a seus antepassados africanos, preservam sua cultura, suas tradições e cantam pra todo canto o orgulho que tem em serem negros.
E o que garante aos negros o direito de ter orgulho de assim serem? O fato de que, na verdade, eles não têm este direito garantido. Por séculos, pessoas foram arrancadas de suas casas, de suas famílias, de seus países, jogadas nos porões de navios, atravessando um oceano para trabalhar de forma escrava em uma terra que não era deles, apenas porque a cor de sua pele não era clara como acreditavam ser a certa por seus ‘donos’. A etnia negra tem todo o direito de ter orgulho de algo que nunca tiveram: de ser quem são. Os brancos não precisam lutar por direito qualquer, porque eles já tem todos, já que nossas leis foram feitas de brancos pra brancos, de maneira geral.
A regra vale para a Comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transgêneros e Transexuais). Como nossas leis foram escritas, votadas e executadas por heterossexuais, os mesmo não têm o que reivindicar. O direito de expressão dos heterossexuais existe desde sempre, já que vivemos em uma sociedade heteronormativa, onde é ensinado e transmitido culturalmente que a heterossexualidade é a única orientação sexual ‘natural’, enquanto as demais são apenas ‘opções’ ou ‘desvios’. Não há motivo de luta por orgulho, espaço ou direitos heteros.
Assim como os negros, gays, lésbicas e afins têm de ir para o embate. Não temos direito de casar ou de se unir com nossos parceiros, não temos segurança em sair nas ruas demonstrando afeto por nossos namorados sem medo de apanhar de homofóbicos. Se formos afeminados, não temos direito de ousar em sonhar em empregos que não sejam de maquiador, cabeleireiro, estilista. Se sofrermos agressões morais ou físicas, nossos agressores não serão punidos adequadamente. Precisamos protestar, gritar, fazer greves, passeatas, caminhadas, vigílias, ações educativas, ações sociais. Precisamos ter orgulho. Orgulho de sermos gays, lésbicas, trans. Precisamos ter tanto orgulho de sermos quem somos, que um dia, não precisaremos mais gritar pra sermos ouvidos, parar avenidas para sermos vistos e para termos nossos direitos respeitados. Neste dia, teremos orgulho de sermos humanos.