quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Religião e orientação sexual: cada um no seu quadrado

Sou ateu. Nasci em uma família de descendentes de italianos, portugueses e espanhóis, tradicionalmente católicos, que tinham dezenas de imagens de santos em casa, além de rezar novenas e ir ‘catolicamente’ a missa aos domingos. A parte disto, minha mãe freqüenta terreiros de Umbanda, meu pai é Espírita Kardecista, e eu já freqüentei igrejas evangélicas, templos budistas e Hare Krishna. Entendo bem o significado da palavra diversidade, gosto dela, e acho extremamente válida para a construção de uma sociedade plural.

O problema é que o caminho de volta, às vezes, não nos leva ao ponto de partida. O respeito exigido, merecido e prestado a qualquer crença quase nunca retorna a comunidade LGBT com a mesma compaixão. Ao ouvir o discurso inflamado de alguns pastores evangélicos¹ contra os direitos dos LGBT, seja a união civil (erroneamente chamada de casamento gay) ou a lei que criminaliza a homofobia (PLC 122), sinto que estes senhores perderam o discernimento de onde começa e onde termina o seu direito de crer.

O seu direito de crença termina onde começa o meu. A religião é um aspecto da vida privada de cada um, e as crenças pessoas só dizem respeito a quem as tem, e mais ninguém. Ninguém pode (nem deve) interferir no direito de crença de outras pessoas, por mais absurdos que sejam algumas dessas crenças.

A recíproca é a mesma para os outros aspectos da vida privada, incluindo, a orientação sexual. Os LGBTs têm o direito (e o dever) de lutar por suas demandas legais e pra que sejam criados mecanismos que defendam o direito de ter sua orientação/identidade sexual respeitados.

Você pode ser evangélico. Você pode acreditar em deus, pode acreditar que Jesus é o único salvador, que TV é coisa do diabo, e que ser gay é pecado. Você é livre pra tudo isso, e enquanto eu puder, vou lutar para que o seu direito de ser livre de crer no que você quiser e de contar isso pra todo mundo. Desde que, isso não interfira no modo de vida de mais ninguém que não queira pensar como você.

Eu sou gay. Quero me casar, quero ter filhos, quero ter o direito de não ser agredido na rua apenas por ser gay, quero não ser demitido porque meu patrão descobriu que eu não era heterossexual como ele supunha. Quero que crianças não sejam ofendidas e agredidas na escola por serem ou parecerem ser gays. Quero que a diversidade, em sua totalidade, seja respeitada. E não vejo, em nenhum dos meus desejos citados neste parágrafo, alguma ofensa moral, alguma ameaça ao bem estar da sociedade, alguma ameaça ao futuro da humanidade.

Tudo o que eu quero é que religiosos respeitem meu direito de ser quem eu sou, já que ser gay (assim como ser hetero) não é uma escolha, e que lutem sim, para que não haja mais violência, física ou moral, contra a comunidade LGBT. Que cada um acredite no que quiser, que cada um viva como bem entender e que ninguém tente interferir neste direito tão essencial de todos os seres humanos: o direito de ser feliz.

  1. Dizer ‘pastores evangélicos’ é uma generalização. Como a grande maioria das igrejas protestantes posiciona-se contra os direitos LGBT, me sinto no direito de generalizar.

10 comentários:

  1. Clareza maior impossível! E teria que ser assim também se fosse escolha -- e o é a partir do momento em que se assume e se luta por esse direito inalienável.

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  2. Muito interessante, sabe. Eu sou do candomblé, que é uma religião que acaba tendo um maior número de homossexuais do que as outras, acredito eu, pelo fato da aceitação ser maior que as outras. É complicado, porque além do preconceito devido ao fato da pessoa ser gay, ainda tem aquela velha história de que candomblé é "macumba, magia negra e afins". Como você disse, o mesmo direito que alguns tem de dizer que tv é coisa do "encardido", eu quero ter de dizer que só acredito em um Deus que dance.

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  3. Concordo plenamente.
    Todos temos direitos e que cada um viva o seu do modo mais pacífico do mundo, sem se agredirem, sem se rotularem...
    A luta é grande e muito difícil, a vitória, creio eu, que esteja bem distante, porém se desistirmos de lutar nunca alcançaremos a vitória. E eu quero ter feito parte desta luta, mesmo embora, eu tenha uma influência muito pequena. Mas são as pequenas com outras milhões de pequenas forças que seguram essa corrente contra o preconceito e luta por um dia de paz e amor.

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  4. Bacana, parabéns pela tua luta, que é uma luta da sociedade. Abraço, do Carlos Damião

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  5. Belíssimo e direto ao ponto!
    Só discordo, de ter que se lutar por direitos que não deveriam ser colocados em xeque, em hipótese alguma!!! Isso é ni mínimo lamentável, visto que teoricamente, por já estarmos em pleno século XXI, deveríamos ter evoluído o suficiente para não estarmos debatendo assuntos como este.
    Abraço e continue assim...
    Carlão

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  6. Oie, Delucca. Mais um excelente texto. Parabéns.
    O grande problema dos fanáticos religiosos é que eles nãos abem discuti com racionalidade e acabam confundindo o seu direito de professar sua fé com o direito de desrespeitar quem pensa diferente ou quem não se enquadra naquiloe les convencionaram como o comportamento moral correto. Acho isso de uma arrogância tremenda. É tão arrogante quanto dizer a alguém como acreditar em Deus e se eles não aceitam, não importa quanto de coração aberto e honesto seja sua dissidência, eles vão para o inferno. Bem, isso não é muito cristão, não é? Sem contar que agindo assim eles vão de encontro a tudo que dizem ser os ensinamentos de Cristo. No fim, é uma sucessão de contradições e argumentos vazios, repetitivos e falidos.

    P.S.: Falei dos cristãos por que também me sinto no direito de generalizar quanto aos protestantes.

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  7. Parabéns pela maneira como você trata o tema e como você escreve. Espero que a sua clareza consiga fazer alguém pensar mais a respeito desse assunto, e que pelo menos alguns daqueles que precisam ler esse texto, leiam.
    ;]

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  8. Chega a ser poético de tão preciso e conciso o seu texto. Adorei!

    A comunidade LGBT ganhou mais um forte aliado!
    Abraço Lucca

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  9. Romanos 1.26-27 Por isso Deus os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza. E, semelhantemente, também os homens, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, homens com homens, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a recompensa que convinha ao seu erro.

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  10. Levítico 20.13 - Quando também um homem se deitar com outro homem, como com mulher, ambos fizeram abominação; certamente morrerão; o seu sangue será sobre eles.

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